Depois do mensalão teremos o Vacinão?

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Publicado Segunda, 05 de Julho de 2021 às 04:12, por: CdB

Desta vez, parece que tudo se complicou. E provavelmente provocará uma crise maior, será a chamada gota d’água. Mesmo porque havia um precedente, no qual trabalhava a CPI do Senado, considerado com bastante desconfiança. Chamara a atenção da CPI a maneira pela qual o presidente Bolsonaro se comportava, não sendo médico e nem cientista, com relação à cloroquina.

Por Rui Martins
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Cloroquina, Covaxin, Bolsonaro não é mais o Messias
Desde o início da pandemia, ignorando as conclusões científicas de outros países e da própria Organização Mundial da Saúde, Bolsonaro sempre se comportou como um caixeiro viajante propagandista em favor da utilização da cloroquina e de um grupo de remédios, chegando a incentivar a população a se proteger com um “tratamento precoce” e um kit Covid reunindo esses remédios considerados ineficazes. Ineficazes, mas com efeitos colaterais perigosos. A cloroquina, indicada para o tratamento da malária e lúpus, pode provocar nas pessoas sadias uma parada cardíaca, como já aconteceu. Ainda recentemente, Bolsonaro, que sempre minimizou o coronavírus, chamando-o de “gripezinha”, ridicularizava a vacina e continuava louvando a eficácia da cloroquina. De onde surgiram as dúvidas? Onde há fumaça, geralmente há fogo. Por que tanto interesse em promover a cloroquina, o “tratamento precoce” e o kit Covid e sua intenção inicial de modificar a bula original da hidroxicloroquina, acrescentando ser indicada na prevenção e tratamento do coronavírus? Ora, com tanta publicidade mentirosa a favor, mesmo sem alteração da bula, a venda desse remédio praticamente duplicou. A agência Repórter Brasil, antes mesmo das desconfianças da CPI, já havia desconfiado de alguma coisa errada na prescrição quase forçada da cloroquina por um presidente sem qualificações médicas, muito ao contrário! Para tirar as dúvidas, consultou os laboratórios farmacêuticos sobre as reais indicações da cloroquina e, todos eles — são seis —, negaram qualquer eficácia na prevenção ou tratamento do Covid. Mesmo os laboratórios Apsen e SEM, que foram os que mais venderam. Ora, embora tivesse sempre se desinteressado pela vacina, chegando mesmo a ridicularizar aquelas produzidas pela China, chamando-as de “vachinas”, e deixando de responder, ainda no começo da crise sanitária, à proposta da Pfizer de milhões de doses de vacinas por um baixo preço, Bolsonaro, como disseram os dirigentes da CPI, prevaricou ao não impedir a compra bilionária da vacina indiana, por preço superior ao da Pfizer. Aqui, Bolsonaro teria provocado seu erro fatal. Além disso, a compra das vacinas indianas foi decidida rapidamente, ao contrário do ocorrido com as outras vacinas. Essa importação das vacinas Covaxin tem todas as características de corrupção, inclusive por prever o pagamento num offshore na Cingapura, em nome de outra empresa e não da contratante. A intermediária nessa compra, a Precisa Medicamentos, não é também uma empresa idônea, por não ter cumprido um contrato anterior. A Anvisa tinha restrições quanto à vacina que também não é indicada para todas as pessoas. A constatação de corrupção no governo na aquisição dessas vacinas, levou a frente ampla de oposição a Bolsonaro a uma convocação antecipada de nova manifestação nacional pelo impeachment do presidente, no próximo sábado. À semelhança do que ocorreu em 1964, quando o golpe militar ocorreu alguns dias depois da grande manifestação com João Goulart, as manifestações populares depois das revelações de corrupção do governo poderão ter efeito inverso, capazes talvez de acelerar um processo de golpe, ao que tudo indica em gestação. A possibilidade de um golpe próximo é também ideia do professor José Álvares Moisés, da USP, responsável pelo programa A Qualidade da Democracia, na rádio da USP, ao enfatizar a aproximação de Bolsonaro com os militares. Por sua vez, o antropólogo e escritor Luis Eduardo Soares, numa entrevista ao jornal português Diário de Notícias e à agência Lusa, em Lisboa, falou também no risco de um golpe de Bolsonaro, caso não seja eleito, ao apresentar seu livro Dentro da noite feroz – o fascismo no Brasil. Entretanto, mesmo se for evitado o golpe, o fascismo bolsonarista já terá se expandido pela sociedade e não será afastado com uma derrota eleitoral. Haverá necessidade de um trabalho de hegemonia cultural, que não foi feito nos governos anteriores. Disso se depreende a necessidade de mais de uma geração. Ele não mencionou, mas ajuntamos: a distorção do protestantismo no populismo conservador evangélico socialmente reacionário será dificilmente revertida. (publicado no Observatório da Imprensa, antes das manifestações do 3 de julho) *** Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu “Dinheiro Sujo da Corrupção”, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, “A Rebelião Romântica da Jovem Guarda”, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI. Direto da Redação é um fórum de debates publicado no Correio do Brasil pelo jornalista Rui Martins.
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