Um discurso que poderia ter sido mas não foi

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Publicado Sexta, 24 de Dezembro de 2021 às 06:16, por: CdB

Era comum à época organizar pequenos comícios onde todos os candidatos a vereador deveriam usar da palavra, esquentando o ambiente para os principais oradores, postulantes à Assembleia Legislativa e à Câmara dos Deputados.

Por Luciano Siqueira - de Brasília

Deu-se nas imediações da Praça Guadalajara, em Garanhuns, Agreste Meridional pernambucano, a torturante experiência de um tímido candidato a vereador de primeira viagem.
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Era comum à época organizar pequenos comícios
Em 1982 o pleito abarcava candidaturas de vereador a governador, incluindo deputados estaduais, federais e senadores. Era comum à época organizar pequenos comícios onde todos os candidatos a vereador deveriam usar da palavra, esquentando o ambiente para os principais oradores, postulantes à Assembleia Legislativa e à Câmara dos Deputados. – Vai você primeiro, convocou o locutor do comício, apontando a um inibido candidato que jamais falara em público. – Vou não. Não sei fazer discurso. – Sabe falar? – Um pouco… – Sabe, sim. Você diz bom dia, boa tarde, boa noite e sabe perguntar às pessoas “como vai?”, não sabe? – Sei, sim senhor. – Então suba no tablado e fale! O indigitado candidato, microfone à mão, repetia trêmulo: – Boa noite! Boa noite! Boa noite… – Diz teu nome, rapaz! – Digo não. – Diz teu número! – Digo não.

Pressão dos militantes

A pressão dos militantes e dos demais candidatos aumentava, tornando o orador mais inibindo ainda. Talvez temendo desapontar a deputada Cristina Tavares, que chegara de surpresa, encerrou o abortado discurso com uma frase algo insossa: – Eu apoio o deputado Luciano, a deputada Cristina, o senador Cid e o governador Marcos Freire. E de pronto devolveu o microfone ao locutor do comício e pálido, trêmulo e suando às bicas, cuidou de escapar sem entretanto evitar que percebessem a grande mancha líquida que se espraiava entre as pernas. E assim a chamada Suíça pernambucana viu frustrada no nascedouro a almejada carreira de um vereador que nunca foi. Mas a história das nossas campanhas eleitorais ganhou um personagem inesquecível.

Luciano Siqueira, é Médico, vice-prefeito do Recife, membro do Comitê Central do PCdoB

As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil

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