Esse conflito vem se arrastando desde 2003 e prova que a falência de uma estrutura estatal, como é o caso da Ucrânia, hoje dominada por bandos mafiosos que se locupletam do poder e que tentam reescrever a história do país.
Por Wellington Duarte– de Brasília
Do belicismo estadunidense pouco se duvida e suas ações, depois da II Guerra Mundial, corroboram com a tese de que os EUA são o país mais intervencionista do mundo e sua visão de democracia depende dos seus interesses geopolíticos.Donetsk e Luhansk
Essa situação já pode ser vista quando do fim da URSS, as regiões de Donetsk e Luhansk, que tinham apoiado a saída da Ucrânia da URSS, defendiam a federalização do país, o que não ocorreu e já em 1993 a região estava numa devastadora crise econômica, com o sucateamento das empresas lá existentes, o que provocou, por exemplo, um poderosa greve de mineiros, que não evitou a decadência econômica dessas regiões. Com eclosão de distúrbios que levaram ao que se tornou a “Revolução Laranja”, em novembro de 1994, aplaudida pela União Europeia, e que consolidou a presença de grupos mafiosos dentro da estrutura estatal, houve uma breve tentativa de autonomia das regiões, e se chegou a criar a República Autônoma da Ucrânia do Sudeste e essa república seria formada por nove regiões do Sudeste da Ucrânia. Participaram delegados de Dobas, da Criméia e Sebastopol e chegaram a pedir que Viktor Yanukovich fosse feito presidente ou primeiro-ministro da Ucrânia, para que este federalizasse o país. Essa tentativa fracassou e custou à região a “má fama” de serem “separatistas” e durante toda a década de 2000 e “guetizou-se” a região, aumentando a forma como essas populações viam o governo central e ascensão de movimentos ultranacionalistas e fascistas, que a partir de 2010 passaram a considerar a Ucrânia como uma espécie de “lar” para esse tipo de organização. O “Euromaidan”, finalizado em fevereiro de 2014, com a fuga de Yanukovich, desencadeou uma violenta reação nas comunidades russas de Donbas e Luhansk, mas também nas outras regiões próximas, especialmente na Criméia. Em 5 de março de 2014, 12 dias depois que os manifestantes em Kiev tomaram o gabinete do presidente deposto, uma multidão de pessoas em frente ao prédio da Administração Estatal de Luhansk, proclamou Aleksandr Kharitonov como “Governador do Povo” na região de Luhansk e em 9 de março de 2014, populares invadiram o prédio do governo em Luhansk e forçaram o recém-nomeado governador de Luhansk, Mykhailo Bolotskykh, a assinar uma carta de renúncia.A repressão
Algo parecido aconteceu em Donetsk e a repressão desencadeada pelo governo central, logo transformou-se em guerra civil aberta, já em abril de 2014, quando se deu a proclamação unilateral da República Popular de Donetsk e de Luhansk, que recebeu a simpatia imediata da Rússia, já envolvida com manifestações antigoverno ucraniano desde janeiro, especialmente em Sebastopol e em toda a região da Criméia, que culminaram com a entrada das tropas russas nessa região já em fevereiro. Esse conflito vem se arrastando desde 2003 e prova que a falência de uma estrutura estatal, como é o caso da Ucrânia, hoje dominada por bandos mafiosos que se locupletam do poder e que tentam reescrever a história do país, a partir do ponto de vista fascista, com o endeusamento, por exemplo, da sinistra figura de Stepan Bandera, hoje enaltecido como “nacionalista”. Além disso essa estrutura mafiosa foi acolhida pelos EUA que, na prática, como fez com a Geórgia, estabeleceu um protetorado político, auxiliado pela União Europeia e tendo como suporte militar a Otan, que hoje tem um certo “as estatal” e isso, de fato, dividiu o país em duas regiões, onde, no oeste os clãs ligados ao Ocidente tem atuado para “europeizar” a Ucrânia e no Leste, de maioria russa, tenta-se sobreviver a um processo de sucateamento programado das instituições econômicas e sociais, que tiveram efeitos devastadores entre os trabalhadores locais. De lá para cá mais de 10 mil pessoas morreram nos combates e a Rússia conseguiu manter as duas repúblicas utilizando a força da persuasão, mas parece que esse tempo acabou, e o que acontecerá nos próximos dias e semanas definirá a forma como a Europa se recomporá desse episódio.Wellington Duarte, é professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio Gande do Norte - UFRN, doutor em Ciência Política e presidente do Sindicato dos Professores da UFRN (ADURN-sindicato).
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