Em áudio, Bolsonaro alerta ex-ministro sobre ‘busca e apreensão’ da PF

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Publicado Sexta, 24 de Junho de 2022 às 12:47, por: CdB

Ao encaminhar o caso ao STF, o juiz Borelli afirma que, “figurando possível a presença de ocupante de cargo com prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, cabe ao referido Tribunal a análise quanto à cisão, ou não, investigação”.

Por Redação - de Brasília
Após o aviso da Procuradoria da República no Distrito Federal (PR-DF) sobre “possível interferência ilícita” do presidente Jair Bolsonaro (PL) nas investigações sobre o ‘gabinete paralelo’ existente no Ministério da Educação e Cultura (MEC), na gestão do pastor Milton Ribeiro, com favorecimento de pastores para obtenção de propina, o juiz Renato Coelho Borelli, da 15ª Vara Federal Criminal, decidiu devolver ao Supremo Tribunal Federal (STF) o inquérito da ‘Operação Acesso Pago’, devido ao possível envolvimento direto de Bolsonaro na suposta organização criminosa.
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Ministro Milton Ribeiro, que é pastor presbiteriano, envolvido em escândalo de desvios de verbas públicas
A decisão do magistrado atende um pedido do Ministério Público Federal (MPF), que propôs a remessa de gravações oriundas da interceptação telefônica de Ribeiro ao Supremo, para averiguação da possível ocorrência dos crimes de violação de sigilo funcional com dano à Administração Judiciária e favorecimento pessoal. A Procuradoria acredita que o áudio revela indícios de vazamento da operação policial, por parte do chefe do Executivo. Borelli, no entanto, tornou públicas apenas as decisões que culminaram na ‘Operação Acesso Pago’ e manteve o inteiro teor dos grampos da PF sob sigilo. Ribeiro teve ligações gravadas pela  Polícia Federal (PF) em diálogo com ao menos três pessoas diferentes. Em um deles, com uma pessoa de nome Waldomiro, o ex-ministro da Educação afirma: — Mas eu acho assim, que o assunto dos pastores… é uma coisa que eu tenho receio um pouco é de… o processo… fazer aquele negócio de busca e apreensão, entendeu?.

Cármen Lúcia

Em outro diálogo com um familiar, logo depois, o aliado do presidente revela: — Ele acha que vão fazer uma busca e apreensão… em casa… sabe… é… é muito triste. Bom! Isso pode acontecer, né? se houver indícios né… Ao encaminhar o caso ao STF, Borelli afirma que, “figurando possível a presença de ocupante de cargo com prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, cabe ao referido Tribunal a análise quanto à cisão, ou não, investigação”. Os autos serão enviados ao gabinete da ministra Cármen Lúcia, que foi relatora da investigação à época em que Milton Ribeiro ainda integrava o governo Jair Bolsonaro. Caberá à ministra decidir sobre eventual prosseguimento da investigação perante a 15ª Vara Federal da Justiça Federal do DF, sua cisão ou desmembramento. O parecer do MPF que implica diretamente o chefe do Executivo foi assinado pelo procurador Anselmo Henrique Cordeiro Lopes, que apontou ainda “indícios de igual interferência na atividade investigatória da Polícia Federal quando do tratamento possivelmente privilegiado que recebeu Milton Ribeiro”.

Isonomia

O delegado Bruno Calandrini, responsável pela investigação que levou à prisão o ex-ministro, também denunciou suposto ‘tratamento privilegiado concedido’ pela PF ao aliado do presidente Bolsonaro. A Procuradoria destaca que Ribeiro não foi conduzido ao Distrito Federal e tampouco levado a qualquer unidade penitenciária “para que pudesse ser pessoalmente interrogado pela autoridade policial que preside o inquérito policial, apesar da farta estrutura disponível à Polícia Federal para a locomoção de presos”. “Nesse ponto, destaque-se que a ausência de Milton Ribeiro perante a autoridade policial foi prejudicial ao livre desenvolvimento das investigações em curso, além de ferir a isonomia que deve existir no tratamento de todos os investigados”, acrescenta o documento.

Diálogos

O relatório da PF reproduz a conversa de Ribeiro com uma pessoa identificada como Waldomiro: MILTON: Tudo caminhando, tudo caminhando. Agora... tem que aguardar né.... alguns assuntos tão sendo resolvidos pela misericórdia divina né...negócio da arma, resolveu... aquele... aquela mentira que eles falavam...que os ônibus estavam superfaturados no FNDE... pra... (ininteligível) também... agora vai faltar o assunto dos pastores, né? Mas eu acho assim, que o assunto dos pastores... é uma coisa que eu tenho receio um pouco é de... o processo... fazer aquele negócio de busca e apreensão, entendeu? Conversa com pessoa identificada como Adolfo: MILTON: (...) mas algumas coisas já foram resolvidas né... acusação de que houve superfaturamento... isso já foi... agora, ainda resta o assunto do envolvimento dos pastores, mas eu creio que, no devido tempo, vão ser esclarecidos....

Frequentando

Em entrevistas e em áudio gravado por um prefeito, Milton Ribeiro diz ter aberto as portas do MEC aos pastores por ordem de Bolsonaro. Os religiosos já frequentavam o Palácio do Planalto antes de Ribeiro assumir o ministério. O GSI chegou a impor sigilo sobre as visitas dos pastores ao Planalto, mas, diante da repercussão negativa, liberou a informação. A Polícia Federal diz ter provas dos supostos crimes cometidos pelos pastores. O juiz que autorizou as prisões e as buscas e apreensões na operação deflagrada na manhã de quinta-feira afirmou haver fortes indícios contra os religiosos, Milton Ribeiro, que também é pastor, e outros dois acusados presos.

Defesa

O advogado Daniel Bialski, que patrocina a defesa do ex-ministro Milton Ribeiro, esclarece que recebeu com surpresa a decisão judicial de remessa dos autos da investigação contra seu cliente novamente para o Supremo Tribunal Federal. “Observando o áudio citado na decisão, causa espécie que se esteja fazendo menção a gravações/mensagens envolvendo autoridade com foro privilegiado, ocorridas antes da deflagração da operação. Se assim o era, não haveria competência do juiz de primeiro grau para analisar o pedido feito pela autoridade policial e, consequentemente, decretar a prisão preventiva. A defesa ainda analisará tudo e o todo que foi anexado aos autos, se lhe for franqueada vista da íntegra da documentação. Todavia, se realmente esse fato se comprovar, atos e decisões tomadas são nulos por absoluta incompetência e somente reforça a avaliação de que estamos diante de ativismo judicial e, quiçá, abuso de autoridade, o que precisará também ser objeto de acurada análise”, conclui.
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