Amazônia vive nova dinâmica de devastação inaugurada por Bolsonaro

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Publicado Segunda, 05 de Setembro de 2022 às 08:41, por: CdB

O desmonte da fiscalização e o incentivo ao crime ambiental provocaram também mudanças qualitativas no desflorestamento dos biomas. Sob o bolsonarismo, a devastação está cada vez mais veloz, mais espalhada pelo território e atingindo regiões, até então, 100% preservadas.

Por Redação, com Brasil de Fato - de Brasília

A comprovada piora dos indicadores de desmatamento durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) não se resume ao aumento da área total derrubada.
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Amazônia perdeu 18 árvores por segundo em 2021
O desmonte da fiscalização e o incentivo ao crime ambiental provocaram também mudanças qualitativas no desflorestamento dos biomas. Sob o bolsonarismo, a devastação está cada vez mais veloz, mais espalhada pelo território e atingindo regiões, até então, 100% preservadas. A conclusão está no Relatório Anual do Desmatamento (RAD) do Mapbiomas, lançado em julho deste ano. O estudo identificou que a grande frente de devastação ambiental no Brasil é a Floresta Amazônica, palco de 60% da área desmatada em 2021. O Brasil de Fato procurou a assessoria de imprensa da Presidência da República e dos órgãos ambientais federais, mas não obteve resposta.

Aumento das grandes derrubadas

A pesquisa revela que os desmatadores estão se sentindo mais à vontade para infringir a lei. Para não despertar atenção das autoridades, as derrubadas normalmente ocorrem em polígonos pequenos. Mas a área média dos alertas de desmatamento cresceu 45% na Amazônia. No bioma, o tamanho saltou de 14 para 21 campos de futebol entre 2020 e 2021. O clima de anistia ambiental vigorou a partir do enfraquecimento dos órgãos de fiscalização. Instituições de servidores federais do setor afirmam que o discurso pró-desmatamento de Bolsonaro, feito ainda durante a campanha em 2018, empoderou os criminosos ambientais, que passaram a reagir com violência contra a fiscalização. Os servidores que decidem trabalhar sob risco de morte enfrentam perseguição de bolsonaristas alçados a cargos de chefia. A Associação Nacional dos Servidores Ambientais relata crescentes episódios de assédio moral e perseguição. Segundo a entidade, foram abertos mais de 100 Processos Administrativos Disciplinares (PADs) baseados em denúncias falsas de infratores ambientais. O PAD pode resultar em demissão.

Ampliação das frentes de desmatamento

Em um movimento inédito, o arco de desmatamento, onde se concentra a expansão ilegal da fronteira agropecuária, cresceu e incorporou o Sul do Amazonas. Nessa região estão cidades que passaram para o topo do ranking de municípios mais devastados. Entre 2016 a 2022, o desmatamento nas cidades de Lábrea, Apuí e Humaitá, todas no Amazonas, cresceram respectivamente 92%, 238% e 817%. As cidades fazem parte da região chamada de Amacro (junção das siglas de Amazonas, Acre e Rondônia, por abranger partes dos três estados), que se tornou uma nova frente de expansão do agronegócio. Segundo o Mapbiomas, a região concentrou 20% de tudo o que foi derrubado na Amazônia entre 2020 e 2021. Na Amacro, o aumento de devastação é causado pela promessa feita por Bolsonaro de asfaltar a BR-319, única ligação por terra de Manaus ao restante do país. A rodovia foi aberta pela ditadura militar, mas perdeu o asfalto por falta de manutenção. Sob Bolsonaro, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) licenciou a obra, ignorando condições impostas pelo próprio órgão ambiental no passado. Com isso, o Amazonas ganhou duas posições no ranking de estados que mais desmatam e foi para segundo lugar em 2021, concentrando 12% da área derrubada. O primeiro lugar continua com o Pará, responsável por quase um quarto de todo o desmatamento no país. Na sequência aparecem o Mato Grosso e o Maranhão, estados que também integram a Amazônia Legal. Em 2019, 31% dos municípios brasileiros haviam registrado alertas de desmatamento. O percentual saltou para 52% em 2021. No acumulado entre 2019 e 2021, segundo o MapBiomas, 61% das cidades tiveram no mínimo um foco de desmatamento detectado.

Mais veloz

Outro indicativo da sensação de impunidade é o aumento da “produtividade” dos criminosos ambientais. A velocidade de desmatamento em todos os biomas aumentou. Em média, foi de 139 para 189 hectares por hora, entre 2019 e 2021. Só a Amazônia perdeu 1,9 hectare por minuto, o equivalente a 18 árvores por segundo. O mercado de máquinas pesadas utilizadas para derrubar a vegetação está aquecido. Abrir uma cratera para retirar minérios do solo, por exemplo, não é mais feito com máquinas pequenas e trabalho manual. Agora, com retroescavadeiras de última geração. Uma empreitada de garimpo que duraria um mês pode ser concluída em uma semana, segundo estimou uma reportagem da Repórter Brasil. A explicação pode estar em uma promessa feita por Bolsonaro e políticos aliados nos estados da Amazônia: a de proibir a destruição do maquinário usado no garimpo ilegal, prática prevista em lei federal e avalizada pelo Supremo Tribunal Federa (STF).

"Desmatamento ilegal" é redundância

No Brasil, dizer “desmatamento ilegal” é quase uma redundância. Isso porque somente 0,87% da destruição da vegetação atendeu às exigências legais. Em quase 80% da área desmatada, os responsáveis podem ser identificados, pois os imóveis rurais estão inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR), com identificação do proprietário. Mesmo assim, o governo federal não fiscalizou. Segundo o Mapbiomas, embargos e autuações realizados pelo Ibama e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) até maio de 2022 atingiram apenas 2,4% dos desmatamentos e 10,5% da área desmatada entre 2019 e 2021. Nem os 52 municípios definidos como prioritários pelo Ministério do Meio Ambiente para o combate ao desmatamento na Amazônia apresentaram índices satisfatórios. Nessas cidades, a penalização ocorreu em 4,4% dos alertas e 21,2% da área desmatada.

‘Passar a boiada’

Seus aliados também utilizam do discurso público para estimular a destruição da floresta. Segundo Bocuhy, isso ficou ainda mais evidente na reunião ministerial de abril de 2020, em que o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles sugeriu “passar a boiada” na política ambiental. “Enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de covid, (precisamos aproveitar) e ir passando a boiada. Ir mudando todo o regramento, ir simplificando normas de Iphan, ministérios da Agricultura, Meio Ambiente, ministério disso e daquilo. Agora é hora de unir esforços para dar de baciada a simplificação regulamentar que ‘precisamos’ em todos os aspectos”, disse Salles na ocasião. A fala, conforme destaca o presidente do Proam, “admite e tutela uma figuração da área ambiental para fazer de conta que protege. Quando, na verdade, (o governo Bolsonaro) estaria atendendo aos interesses econômicos dos aliados do governo, sua base, onde se abriga o agronegócio mais atrasado do Brasil”, observa.

Amazônia: tema ausente em debate

Apesar da dura realidade vivida pela floresta amazônica nos últimos anos, o tema esteve pouco presente nas falas dos candidatos e candidatas à Presidência da República durante o primeiro debate realizado em 28 de agosto. Para Bocuhy, os políticos perderam a oportunidade de discutir questões ambientais que estão impactando a população brasileira de Norte a Sul, como as chuvas volumosas e incêndios excessivos pelo tempo seco, efeito das mudanças climáticas. O que demonstra, segundo ele, a necessidade de educação ambiental da classe política para a sobrevivência com qualidade da atual e das próximas gerações.
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