Viver, morrer, viver de novo!

Arquivado em:
Publicado Quarta, 04 de Abril de 2012 às 09:41, por: CdB

Avida tem dessas coisas. Parece às vezes que a gente já viveu tudo. Já doouparte de seus dias, pregou a mensagem até no deserto, caminhou mundos e fundos,entregou-se como se mais tempo não houvesse, amou os que ninguém amava.

Vocêdiz coisas fortes, fala verdades. Prega a igualdade. Questiona as leisvigentes. Enfrenta a religiosidade hipócrita. Visita os pobres, acarinha os desprezadospelo poder vigente. Pratica sua mensagem até a última gota.

Arranjouadversários e inimigos. Gente que não gostou de suas palavras e gestos. Vocêcontinua a pregar, não deixa de dizer o que pensa. Espreitam-no na esquina,deixam recados por terceiros. Você começa a sentir algum medo. É precisofazer-se acompanhar pelos amigos mais chegados, cuidar os passos, eventualmenteaté esconder-se.

Vocênão é tão novo nem tão velho, mas sente que o dia derradeiro está chegando.Resolve reunir os amigos mais amigos, aqueles aos quais você transmitiu suasverdades mais verdadeiras e a quem abriu de fato seu coração, a quem você pediupara continuarem sua estrada. Você lhes diz que sua hora está aí, na porta, nãomais no horizonte. Oferece-lhes a última comida, a última bebida, abençoa e partilhacom todos e todas o que há para comer e beber, distribuisuas últimas palavras, desejos e sonhos. Pede que não o esqueçam nem abandonem.

Eles,os que não gostam de você, os que não aprovam suas ideias, os que sentem seusprivilégios atingidos, o prendem na esquina, na beira de um bosque. Fazem umjulgamento de fachada atrás de umas árvores, julgam-no culpado por todos osproblemas do mundo. Tentam desmoralizá-lo com calúnias e mentiras. Dizem quevocê disse ser o salvador da pátria, o redentor de todos os pecados, o julgadorde todas as injustiças. Resolvem executá-lo. Jogam seu corpo em cima de ummonte de palha, à luz da rua, para que todos e todas saibam que você, renegado,rebelde, insubmisso eterno, está morto, definitivamente morto. Que ninguém váatrás de você, ninguém o procure nunca mais, tenha a coerência e a hombridadede dizer que foi seu amigo e companheiro ou, muito menos, tenha a coragem deassumir e seguir suas ideias.

Masvocê não pode morrer definitivamente ou para sempre. Alguém precisa lembrar-sede suas pregações. Afinal, você não passou pelo mundo para ser um pobredesgraçado morto de quem não se fala mais, que não deixou nada registrado porescrito ou de alguma outra forma. Uma meia dúzia de medrosos, aqueles de suaúltima janta, anda se esquivando pelas vielas e nas quebradas da noite com medode aparecer e assumir publicamente que moraram contigo, passearam contigo pelascoxilhas, percorreram favelas, enfrentaram os hipócritas dos templos, confrontarama teu lado os poderosos de ocasião, beberam tuas palavras, te amaram. Vocêprecisa reaparecer, ser de novo reconhecido, alguém precisa continuar seuspassos, trilhar seus caminhos.

Masquem, quem o fará? Quem terá vergonha na cara e coragem?

Umamulher, sim, uma mulher terá coragem para proclamar que viu seu corpo, que vocêcontinua vivo, e que é preciso seguir em frente, reunir de novo os mais amigosdos amigos, para que cada um deles reúna seus amigos mais amigos, e aí já sãodezenas, mais os mais amigos dos mais amigos deles, e aí serão centenas, daquia pouco milhares ou milhões.

Vocêestá vivo, sua vida não foi em vão. Suas ideias de um mundo justo, deigualdade, de um Reino onde todos e todas são irmãos irmãs, companheiros ecompanheiras, de um Reino onde a liberdade terá a última palavra, o amor estaráacima de tudo não foi enterrado, sepultado, não foi crucificado. A vidacontinua, assim como o sonho que você plantou. Sua passagem pelo mundo não foiem vão.

Felizpassagem a todas e todos. Feliz Páscoa!

Em quatrode abril de dois mil e doze

Tags:
Edição digital

 

Utilizamos cookies e outras tecnologias. Ao continuar navegando você concorda com nossa política de privacidade.

Concordo