Índia lança manual contra linguagem ofensiva para mulheres em julgamento

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Publicado Sexta, 18 de Agosto de 2023 às 15:07, por: CdB

O manual defende que “se os juízes invocarem estereótipos nocivos, isso pode levar a uma distorção da aplicação objetiva e imparcial da lei e perpetuar a discriminação e a exclusão”.


Por Redação, com RTP - de Nova Délhi


O Supremo Tribunal da Índia lançou um glossário de palavras que os juízes devem evitar ao redigir as sentenças. O objetivo é tentar eliminar os estereótipos de gênero que "não são apenas degradantes e retrógrados, mas podem obscurecer julgamentos". O manual também deixa instruções para os advogados que devem evitar arquivar casos com base no gênero e coibir palavras usadas no contexto de mulheres e crimes sexuais.




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Objetivo é auxiliar juízes e comunidade jurídica

O livro intitula-se Handbook on Combating Gender Stereotypes (Manual de Combate aos Estereótipos de Gênero). É uma espécie ferramenta que reúne um conjunto de sugestões linguísticas a serem adotadas nos tribunais.


A iniciativa partiu do Chefe de Justiça da Índia, Dhananjaya Y Chandrachud, que listou algumas frases comumente usadas no contexto de mulheres, crianças, crimes sexuais e algumas noções comuns sobre gênero. Defende que os termos até hoje usados são arcaicos, ofensivos e devem ser substituídos.


O manual defende que “se os juízes invocarem estereótipos nocivos, isso pode levar a uma distorção da aplicação objetiva e imparcial da lei e perpetuar a discriminação e a exclusão”.


O documento não é obrigatório para os juízes e advogados, mas um indicador de procedimentos. A medida tem o apoio do Supremo Tribunal e já está no site da instituição.



Palavras que devem ser afastadas


O manual identificou palavras e frases a serem descartadas nas salas de tribunal, entre elas meretriz, prostituta, sedutora, mulher caída em desgraça, mulher de virtude fácil, além de mulher indiana, mulher ocidental, mulher de carreira ou mulher casta. Tudo isso, de acordo com o livro, deverá ser substituído simplesmente por mulher.


O livro também desaconselha o uso de adjetivos como obediente e fiel para classificar  uma esposa. Sugere que se altere dona de casa por cuidadora da casa, um caso amoroso por relação fora do casamento, prostituta por profissional do sexo e o eufemismo da provocação pelo termo mais preciso assédio sexual.



Estereótipos


A equipe que assina a publicação argumenta que a alteração da terminologia permitirá eliminar os estereótipos de gênero, que não são apenas degradantes e retrógrados, mas também podem obscurecer julgamentos.


– O manual visa a auxiliar os juízes e a comunidade jurídica a identificar, compreender e combater os estereótipos sobre as mulheres – escreveu Chandrachud no prefácio do livro.


– Apoiarem-se em estereótipos predeterminados na tomada de decisões judiciais contraria o dever dos juízes de decidir cada caso em seus méritos, de forma independente e imparcial. Em particular, a confiança em estereótipos sobre as mulheres pode distorcer a aplicação da lei de forma prejudicial.


Comunicado divulgado pelo Supremo Tribunal reitera que a “iniciativa inovadora” visa a cumprir o objetivo da Justiça de erradicar “estereótipos de gênero preconcebidos” do discurso judicial, especialmente aqueles relativos às mulheres.


Ranjana Kumari, chefe do Centro de Investigação Social em Nova Delhi, diz que o manual é um documento “há muito esperado”. Ela destacou o fato de Chandrachud ter reforçado a ideia de que "as palavras não são apenas palavras, mas influenciam julgamentos".


– A linguagem é uma ferramenta pela qual moldamos percepções e comportamentos. Quando os advogados usam palavras como vagabunda ou prostituta, isso faz parte da vergonha da vítima e afetará o destino legal de uma mulher.


Palavras como adúltera, concubina ou amante também devem ser afastadas.


No caso de crianças ou jovens, o glossário lista palavras que classifica como humilhantes, como o termo bastardo e lembra que deve ser afastada a expressão “alguém em idade para casar”.


O livro contém ainda uma reflexão sobre a vestimenta feminina e hábitos como fumar ou beber. Defende que esses fatores não podem ser entendidos como sinais facilitadores para crimes sexuais ou defesa das pessoas acusadas de terem perpetrado tais crimes. “A roupa ou traje de uma mulher não indica que ela deseja envolver-se em relações sexuais, nem é um convite para tocá-la”, afirma o manual.






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