IMNS encerra hospitalização de pacientes psiquiátricos

Arquivado em:
Publicado Quinta, 11 de Novembro de 2021 às 11:47, por: CdB

Para essa desmobilização, os agora ex-internos do hospital foram realocados em residências terapêuticas por toda a cidade, onde continuam sendo acompanhados por equipes multidisciplinares dos centros de atenção psicossocial (CAPS).

Por Redação, com ACS - do Rio de Janeiro “Manicômio nunca mais”! Essa foi a exclamação dos funcionários do Instituto Municipal Nise da Silveira (IMNS), hospital psiquiátrico no Engenho de Dentro, Zona Norte do Rio,  na despedida do último paciente hospitalizado, em 26 de outubro. O grito, preso na garganta há anos não só da equipe do IMNS, mas de todos os engajados na luta antimanicomial, comemora o encerramento do maior e o mais antigo hospício do país, um marco na história da psiquiatria brasileira.
pacientes.jpeg
Funcionários comemoraram o encerramento do maior e o mais antigo hospício do país
Para essa desmobilização, os agora ex-internos do hospital foram realocados em residências terapêuticas por toda a cidade, onde continuam sendo acompanhados por equipes multidisciplinares dos centros de atenção psicossocial (CAPS). A desinstitucionalização dos pacientes é mais um importante passo da reforma da política de saúde mental da prefeitura do Rio, que promove uma mudança de modelo assistencial. Em vez de ficarem trancados em hospícios e privados de suas vidas, os pacientes são tratados com humanização e atividades multidisciplinares, incluindo terapias ocupacionais, e têm de volta sua cidadania. – A história da Psiquiatria é marcada por violência e sofrimento, e lançar um novo olhar para essas pessoas faz toda a diferença no equilíbrio da sua condição, como elas interagem e reagem com o mundo à volta. Doença mental não pode ser sinônimo de isolamento. O cuidado que os pacientes psiquiátricos precisam passa, agora, a ser  oferecido mais próximo de onde eles vivem, com participação da comunidade. Não é o paciente psiquiátrico que deve se encaixar nos moldes da sociedade excludente, mas a sociedade deve estar preparada para acolhê-lo – destacou o superintendente de Saúde Mental do Rio de Janeiro, Hugo Fagundes. Flávio Sobreiro, diagnosticado com autismo grave, conta com histórico de longas internações, desde os 12 anos de idade, em diferentes unidades psiquiátricas, que usavam diversos métodos de tratamento – muitos deles cruéis e desumanos. Mas foi no IMNS, desde 2012, que ele encontrou acolhimento e tratamento humanizado, que melhoram sua qualidade de vida. Hoje, com 39 anos, ele foi o último paciente a deixar IMNS para experimentar uma nova realidade na residência terapêutica – uma alternativa de tratamento que há poucos anos sequer era considerada. Ele é um dos mais de quatro mil usuários da rede de saúde mental que o município do Rio libertou dos manicômios, seja através de residências terapêuticas ou do retorno ao convívio familiar. – Esses pacientes estão retomando sua cidadania e dignidade, num processo de ressocialização e inclusão na comunidade. Apesar do encerramento das atividades do Instituto Nise da Silveira enquanto hospício, manteremos nosso serviço ambulatorial de saúde mental e daremos continuidade à ocupação artística e cultural das antigas enfermarias da unidade, algo tão emblemático nessa transformação – apontou a diretora do IMNS, Érika Silva e Pontes.

Residências terapêuticas

A residência terapêutica (RT) é um recurso para que pacientes psiquiátricos internados deixem os manicômios e passem a morar em casas ou apartamentos com suporte de profissionais dos CAPS, sendo reinseridos na comunidade. É trabalhado o resgate dos laços familiares para a construção da cidadania e o ganho da autonomia, mas fundamentalmente para a vida em liberdade, seja em RTs ou mesmo vivendo sozinhos. No Município do Rio há, atualmente, 92 RTs em diferentes bairros, abrigando até seis moradores cada uma. De acordo com a complexidade de cada RT e seus moradores, é definido o grau de assistência demandado, desde uma maior autonomia até um acompanhamento 24h, sete dias por semana. O foco é o tratamento humanizado, socializado e individualizado para as necessidades de cada caso.

Instituto Municipal Nise da Silveira

O Instituto Municipal Nise da Silveira (IMNS) nasceu em 1911, como Colônia de Alienados do Engenho de Dentro. Foi lá que, a partir da década de 1940, a dra. Nise da Silveira trabalhou em defesa de métodos humanizados de terapia, revolucionando o tratamento de pacientes psiquiátricos. A partir dos anos 2000, o instituto, municipalizado, seria rebatizado sua homenagem. Por possuir a maioria dos registros do Hospício D. Pedro II, o primeiro do Brasil e da América Latina, o IMNS era, até então, considerado o mais antigo hospício ativo no país. O final da década de 1970 marca o início do movimento de Reforma Psiquiátrica no Brasil, que aproximou usuários, familiares, trabalhadores da saúde e sociedade civil em um movimento de questionamento ao caráter normatizante, excludente e violento dos saberes e práticas da Psiquiatria. De uma instituição que realizava cirurgias psiquiátricas, como lobotomias e aplicava eletrochoques, o IMNS tornou-se um importante centro de articulação da luta antimanicomial, sendo palco de debates e transformações vanguardistas na assistência e nas políticas de saúde mental. Com o encerramento das internações, o IMNS permanece sendo referência na promoção da saúde mental, através da arte, cultura, esporte, lazer e oficinas de geração de renda. A unidade abriga um importante acervo histórico aberto ao público, composto por documentos, livros, prontuários, móveis e obras artísticas, que retratam os 110 anos da instituição documentam a história da Psiquiatria e da assistência à loucura no Brasil. Ao longo de seus 110 anos, o IMNS, que já chegou a ter mil internos ao mesmo tempo, dá adeus ao último morador, encerrando sua história enquanto manicômio traçando um caminho de novas possibilidades. Do hospício ao parque, a Prefeitura do Rio está transformando a área do manicômio, de cerca de 79 mil m² e que inclui o Museu de Imagens do Inconsciente, num parque urbano, integrando o espaço à vizinhança. No dia 6 de setembro, foi iniciada a derrubada do muro do complexo, que será substituído por grades, tornando-se visualmente mais acessível à população, que também passa a contar com atividades esportivas, artísticas, culturais e de lazer, parte da ressignificação da instituição.
Edição digital

 

Utilizamos cookies e outras tecnologias. Ao continuar navegando você concorda com nossa política de privacidade.

Concordo