Espanha vê na América Latina uma saída para a crise

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Publicado Sexta, 16 de Novembro de 2012 às 13:23, por: CdB

Espanha vê na América Latina uma saída para a criseA XXII Cúpula Ibero-americana de Chefes de Estado e de Governo, iniciada nesta sexta-feira na cidade de Cádis, se anuncia como uma grande mesa de negócios, na qual as duas “pátrias-mãe” latino-americanas pedem a suas ex-colônias para “arrimar el hombro” e ajudá-las a superar as dificuldades econômicas. A presidente Dilma Rousseff, na foto com o presidente do Haiti, é uma das estrelas do encontro. A reportagem é de Naira Hofmeister, direto de Madri.

Naira Hofmeister - Madri

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Madri - O esforço feito pela família real espanhola para convencer os mandatários latino-americanos a participar da XXII Cúpula Ibero-americana de Chefes de Estado e de Governo em Cádis deu resultado. Desde a quinta-feira, 18 líderes de nações latinas desembarcaram na Espanha para participar de um encontro “pouco efetivo”, como admitiu o presidente do Equador, Rafael Correa, em uma entrevista ao diário El País.

“Qualquer cúpula que inclua a mais de dois já perde eficiência e esta inclui a muitíssimos. É, aliás, algo sobre o que devemos pensar: talvez nossos povos estejam cansados de que frequentemos tantas cúpulas e eles, tantos abismos”, criticou Correa.

No caso de Espanha e Portugal, a reunião é considerada justamente uma oportunidade para sair do abismo – uma saída que, se pactada, será mais dirigida às empresas que aos cidadãos que seguem padecendo com cortes nos gastos públicos (embora seja também verdade que a aposta é por facilitar a entrada de negócios estrangeiros de pequeno e médio porte, já que as grandes marcas – principalmente as espanholas – estão na América Latina há anos).

As matérias do El País, principal jornal espanhol, não deixam dúvidas sobre o caráter da Cúpula. “O que há do outro lado do Atlântico é um mercado de uns 550 milhões de pessoas e a Espanha tem uma posição interessante para tentar tirar alguma vantagem”, publica o jornal, fazendo referência ao número de investimentos que o país ibérico possui no continente das “ex-colônias”.

Em outro texto, o correspondente de Buenos Aires, Francisco Perejil, se ressente de que não haja eco do encontro nos mais importantes diários latino-americanos. Por fim, o correspondente no Brasil assina um texto com um rasgado elogio ao “republicanismo” da presidente do Brasil, Dilma Rousseff, uma das estrelas do encontro. “Dilma tem consciência de que é em primeiro lugar presidenta de todos os brasileiros. Dos que votaram nela e também dos mais de 40 milhões que se opuseram nas urnas e que hoje estão oferecendo-lhe seu apoio nas pesquisas, facilitando um segundo mandato”.

Dilma Rousseff é uma das estrelas
É inegável que a mandatária brasileira é uma das grandes estrelas da Cúpula de Cádis - sua presença, diz o El País, “minimiza outras previsíveis ausências”. O jornal se refere possivelmente à chefe de Estado argentina, Cristina Kirchner, que conquistou a inimizade da mídia e do povo espanhol depois de nacionalizar a subsidiária da Repsol no país, a YPF (mas que garante seguir sendo merecedora de um trato “carinhoso” por parte do rei da Espanha, don Juan Carlos); e também a Hugo Chávez, da Venezuela, que em uma reunião como a que se celebra agora em Cádis, no ano 2007, foi alvo da já anedótica repreensão do monarca espanhol: “¿porqué no te callas?”

Além dos dois presidentes, não compareceram o mandatário uruguaio, José Mujica – por problemas de saúde –, o guatemalteco Otto Pérez Molina, o cubano Raúl Castro e o paraguaio Federico Franco, cuja ausência foi solicitada pela Espanha para evitar polêmicas e boicotes de outros chefes de Estado, críticos a destituição do ex-presidente Fernando Lugo.

Para garantir a presença de Dilma Rousseff, a Espanha empenhou toda a sua artilharia: estiveram em Brasília em um intervalo de 32 dias o ministro de Relações Exteriores, José Manuel García Margallo, o próprio presidente do governo, Mariano Rajoy, e o rei em pessoa - na época, junho, ele ainda estava ainda chamuscado pelo escândalo de uma caça a elefantes que realizou na África enquanto o país se afundava na crise econômica.

O Brasil é o país da moda na Espanha. Não são poucos os cidadãos que querem emigrar para o gigante latino-americano, que ocupa quase diariamente manchetes econômicas que falam de crescimento, consumo, lucros, empregos.

São tantos os pedidos de informação sobre emigração que a embaixada em Madri recebe e o Itamaraty organiza no dia 23 deste mês um evento com o título “Trabalhar em Brasil”, no qual o conferencista será o cônsul honorário do país.

Algo que será muito bem vindo pelo país em áreas carentes de mão de obra qualificada, conforme antecipou em entrevista exclusiva à Carta Maior o ministro de Assuntos Estratégicos, Moreira Franco.

Depois de Cádis, presidente vai a Madri
Embora os resultados da XXII Cúpula Ibero-americana de Chefes de Estado e de Governo não sejam tão fundamentais para o Brasil como podem ser para Portugal e Espanha , o fato é que o país pode ganhar muito com o interesse dos europeus. Segundo a Agência Brasil, a Espanha é o segundo maior investidor externo no Brasil, com estoque acumulado de US$ 85,3 bilhões, e o 10º maior comprador das exportações nacionais, com volume superior a US$ 4 bilhões (2011), à frente de países como França, Rússia e Índia. A balança comercial entre os dois países tem crescido em valores nos últimos dez anos.

Há também grandes expectativas de assinaturas de acordos na área de ciência e tecnologia, principalmente no setor militar, já que a crise tem levado os países europeus a abrir mão de determinados segredos de estado para poder sair do buraco.

Outro tema que será pautado – mais pela imprensa brasileira do que pelos governos – será o dos brasileiros inadmitidos em Barajas, o já temido aeroporto de Madri. O Planalto considera que o problema está praticamente solucionado, com um número de entradas negadas bem reduzido nos últimos meses.

Na área política, Dilma, que é uma crítica das medidas de austeridade e desde que iniciou seu mandato pressiona o Fundo Monetário Internacional (FMI) – do qual o Brasil é um dos financiadores – para que modifique os critérios para o empréstimo ou o resgate de países em dificuldades econômicas, pode se transformar inclusive em uma aliada do conservador Mariano Rajoy. O governo espanhol vem a tempos pedindo à União Europeia para que reduza a pressão por ajustes e redução do déficit de forma tão imediata.

Para dar conta da agenda de interesses bilaterais, a presidente Dilma vai estender a sua permanência no país ibérico – depois dos dois dias de conferências em Cádis, 16 e 17 de novembro, e um domingo para descansar, a chefe do executivo brasileiro passará toda a segunda-feira na capital espanhola.

Em Madri, conversará com alunos brasileiros na Casa Brasil, que completa 50 anos de existência na cidade, e com empresários em um evento promovido pelo El País. Mas também se encontrará a portas fechadas com os anfitriões Mariano Rajoy e o rei Juan Carlos.


Fotos: Ichiro Guerra/PR
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Edição digital

 

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