Nova fase da Lava Jato atinge em cheio as agências de propaganda

Arquivado em: Arquivo CDB
Publicado terça-feira, 14 de abril de 2015 as 12:40, por: CdB
André Vargas (PT-PR)
André Vargas (ex-PT-PR) foi preso na 11ª fase da Operação Lava Jato

A partir desta terça-feira, a equipe do procurador da República Carlos Fernando Lima, que integra o grupo de investigadores da Operação Lava Jato, inicia a perícia nos contratos de publicidade que a Petrobras e os suspeitos de promover a maior roubalheira na história da companhia mantiveram ao longo da última década. Os procuradores começaram a buscar pagamento suspeitos em negócios milionários de propaganda do governo federal para empresas de fachada ligadas a políticos.

Uma vez detectados os desvios, a tendência é que as agências e produtoras peçam o recurso da delação premiada. Entre as produtoras investigadas estão a Conspiração Filmes, que pertence a Andrucha Waddington, marido da atriz Fernanda Torres. Uma das maiores produtoras do país, contratada pelas Organizações Globo para a realização de conteúdo para os canais de TV que controla, a Conspiração Filmes foi anexada ao processo por conta de contratos com duas firmas de fachada controladas pelo ex-deputado André Vargas e seu irmão (LSI Solução e Serviços Empresariais e Limiar Consultoria e Assessoria em Comunicação).

Vargas foi preso na sexta-feira, no início da 11ª fase da Lava Jato, batizada de ‘A Origem’, com foco na área de Comunicação da Petrobras. A suspeita é de que o modelo de desvios de até 10% em contratos de publicidade da Caixa Econômica Federal e do Ministério da Saúde, observado entre 2011 e 2014, tenha sido replicado na estatal petrolífera.

Empresas legais e outras, de fachada, estariam em um esquema do qual Vargas teria participado. O parlamentar foi vice-presidente da Câmara e secretário de Comunicação do PT na período investigado. Ele teve ordem de prisão cumprida pela PF junto com os ex-deputados Luiz Argôlo (SD-BA), Pedro Corrêa (PP-PE) e outros quatro suspeitos.

Um inquérito aberto no fim de 2014 para a área de Comunicação da Petrobras servirá para centralizar as apurações. Os investigadores buscam novos envolvidos, além de Vargas, e vão reunir elementos já levantados de sobrepreço e pagamentos sem contrato no setor, via Diretoria de Abastecimento.

– Existe uma investigação aberta e é preciso olhar melhor essa área de Comunicação, em especial, na Diretoria de Abastecimento – afirmou a jornalistas o procurador Fernando Lima.

Cachorro grande

Citada no esquema de desvio de recursos da estatal do petróleo, a agência de publicidade e propaganda BorghiLowe é uma das maiores agências de publicidade do país. Na quarta colocação em ranking que leva em conta o investimento publicitário dos anunciantes atendidos por cada agência, os clientes da BorghiLowe movimentaram R$ 3,2 bilhões em 2014 segundo pesquisa do Ibope, divulgada em dezembro do ano passado.

A agência, que está entre “os cachorros grandes” da publicidade, no país, segundo um dos promotores que investiga o caso, detém clientes como a Caixa Econômica Federal, Petrobras Distribuidora e BNDES, na área pública, e a Unilever, Subway e Fast Shop na iniciativa privada. Além do alto faturamento, a agência ostenta prêmios por três de suas campanhas na última edição do Festival de Cannes.

A BorghiLowe, com mais de 100 funcionários, é comandada pelo publicitário José Henrique Borghi. Ele integra a lista dos 20 mais influentes de uma revista especializada no segmento. Um de seus principais executivos, Ricardo Hoffmann também foi preso preventivamente na semana passada, pela Polícia Federal. Hoffmann ocupou os cargos de vice-presidente e diretor geral do escritório de Brasília da BorghiLowe até o fim do ano passado. Em dezembro, a Receita Federal fez os primeiros pedidos de informação sobre contratos da agência com o governo e o profissional foi afastado de suas funções.

Hoffmann atuava em Brasília desde 1994, na gestão de verbas do governo federal. Sob seu gestão, o escritório de Brasília da agência chegou a ter 50 funcionários. Em entrevista publicada pela revista Propaganda, em novembro de 2012, Hoffmann disse que os resultados que obteve no mercado publicitário de Brasília se devem ao trabalho “planejado, focado e dedicado”, e não ao lobby político.

Na mesma entrevista, ele afirmou que, “de um modo simplista e até reducionista, as pessoas dizem que em Brasília tudo é política”.

– Na verdade, dizem pior, que tudo é sacanagem. Eu penso diferente, e consegui convencer meus pares de que vale a pena acreditar na competência – diz ele.

Bônus milionários

As suspeitas sobre a BorghiLowe se acentuaram após os investigadores constataram o pagamento de bônus a produtoras e outras agências de publicidade. Não existem regras formais para este tipo de pagamento, apenas o entendimento comum, segundo o Conselho Executivo das Normas-Padrão (Cenp). A entidade é formada por representantes do próprio mercado e regula as práticas comerciais no meio publicitário do Brasil.

De acordo com o Cenp, existem critérios que devem ser observados nos bônus que são pagos pelos veículos de comunicação, como emissora de TV, rádio e jornais, para as agências de publicidade. Essa pratica, segundo afirma o Conselho, visa incentivar as agências a comprar mais espaços de propaganda.

As regras do Cenp determinam que o veículo deve fazer o pagamento diretamente à agência com emissão de nota fiscal. Não é permitido o pagamento para um terceira empresa, como aconteceu no caso da BorghiLowe e das produtoras. “Os planos de incentivo às agências mantidos por veículos não contemplarão anunciantes”, rege a norma do Cenp.

Segundo a investigação, a BorghiLowe teria contratado os serviços da Conspiração Filmes para a produção de comerciais e orientado a produtora a realizar pagamentos de comissões de bônus de volume nas contas das empresas de André Vargas e família. A principal suspeita é a de que contratos regulares serviam para encobrir “serviços de fachada”, com o único objetivo de lavar dinheiro ilícito cujo beneficiário principal seria André Vargas.

“Em vista da existência de prova de que as empresas E-noise, Luis Portela, Conspiração, Sagaz e Zulu Filme teriam realizado depósitos em contas controladas por André Vargas, com envolvimento da empresa Borghi Lowe, justifica-se a quebra de sigilo bancário e fiscal das referidas empresas, ainda que as primeiras não tenham necessariamente se envolvido de forma intencional nos crimes”, decidiu o juiz Sérgio Moro, no bojo do processo. “Também se justifica a quebra do sigilo da empresa BH Serviços já que de titularidade de Ricardo Hoffmann da Borghi, sendo possível que o mesmo esquema tenha ali sido reproduzido”.

Conspiração

A Conspiração Filmes é uma das sócias da Rio Bravo Investimentos, fundada por Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central no governo de Fernando Henrique Cardoso. É também sócia do Banco Icatu, de Katia de Almeida Braga, filha do banqueiro Antônio Carlos de Almeida Braga. Com filiais no Rio de Janeiro, São Paulo e em Betim (MG), a Conspiração tem 250 funcionários. Pedro Buarque de Hollanda é o presidente do conselho de administração e o diretor de cinema Gil Ribeiro é o diretor presidente.

Entre os principais executivos também estão Leonardo M. Barros, senior vice-presidente internacional, Adrien Muselet, diretor executivo do Cinema, Cristina Lopes, diretora executiva da Publicidade, Eneide Maia, diretora de Planejamento e Controle de Produção, Gustavo Baldoni, diretor executivo de TV, Maria Amélia Madureira de Pinho Leão Teixeira, diretora administrativa e financeira, e Renata Brandão, diretora executiva da Corp/Concept.

Entre os 16 sócios da Conspiração Filmes está o cineasta Andrucha Waddington. Ele também figura na lista dos possíveis sonegadores de impostos citados no escândalo do SwissLeaks como dono de uma conta numerada no banco HSBC, na Suíça. O diretor de cinema aparece nos registros dividindo uma conta com seu irmão Ricardo Waddington.

A reportagem do Correio do Brasil entrou em contato com a Conspiração Filmes, mas não obteve resposta às perguntas formuladas, até o fechamento desta matéria.